Francis Ford Coppola costuma rejeitar, de forma sucessiva, convites para dar aulas ou lecionar sobre cinema. Nas últimas vezes em que lhe perguntaram o motivo de recusas tão frequentes, explicou que, mesmo trabalhando no ramo há quase 50 anos, ainda se considerava um estudante da sétima arte e que, por isso, não se sentia à vontade para ensinar. A postura humilde é nobre, mas, nesse caso, parece um tanto inadequada para um homem que dirigiu produções como a trilogia ‘O Poderoso Chefão’, ‘A Conversação’ e ‘Apocalypse Now’ — partes importantes de uma obra extensa, que poderá ser vista na íntegra a partir de amanhã, e até o próximo dia 29, na mostra ‘Francis Ford Coppola: O Cronista da América’, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB).
O festival vai exibir 25 filmes assinados por Coppola, desde ‘The Bellboys and the Playgirls’ e ‘Tonight for Sure’ — ambos de 1962, quando ele ainda era apenas um aluno do curso de Cinema da University of Southern California —, até as criações mais recentes como ‘Tetro’ e ‘Virginia’, nas quais fez experimentações com os cinemas digital e 3D. O evento vai mostrar também as contribuições com Roger Corman e os longas que o consagraram, sobretudo os realizados na década de 1970.
“Foi quando ele chegou ao ponto mais alto da carreira. Esse momento foi no fim de 1969, com ‘Caminhos Mal Traçados’, e atravessa os anos 1970, começando com as duas primeiras partes da trilogia ‘O Poderoso Chefão’, passando por ‘A Conversação’ e atingindo o auge em ‘Apocalypse Now’”, explica o curador, Ricardo Gonçalves de Almeida.
A mostra se justifica não apenas pela qualidade dos filmes, mas pela postura do realizador. Avesso a seguir imposições dos estúdios de Hollywood, Coppola costuma financiar as próprias produções, condição que lhe garante maior liberdade criativa, mas também o coloca em situação de risco financeiro, algo que aconteceu logo depois de lançar, em 1981, ‘O Fundo do Coração’, filme que foi um fracasso de crítica e bilheteria e que, por consequência, o obrigou a fechar o Zoetrope Studio, um prejuízo tão grande que quase o levou à falência.
“Coppola teve que vender quase tudo o que tinha para pagar suas dívidas. Podemos dizer que, nos dez anos seguintes, ele trabalhou como um diretor contratado. Aceitava dirigir filmes pelo dinheiro que receberia para diminuir o rombo nas finanças. Essa situação só começou a reverter em 1990, a partir do sucesso de ‘Drácula de Bram Stoker’”, explica Gonçalves.
A mostra, cujos longas também serão exibidos no Centro Cultural Severiano Ribeiro — Odeon entre os dias 18 e 24, apresenta também o documentário ‘Francis Ford Coppola: O Apocalipse de um Cineasta’, de Fax Bahr, George Hickenlooper e Eleanor Coppola, mulher do cineasta, sobre a tumultuada realização da obra-prima ‘Apocalypse Now’, de 1979.
O filme, baseado em ‘O Coração das Trevas’, de Joseph Conrad, e também financiado por Coppola, se transformou em uma saga que, por muito pouco, não enlouqueceu o diretor. Por várias razões: tempestades tropicais destruíram os cenários montados nas Filipinas, onde o longa foi registrado, o que fez o custo da produção disparar, atrasando demais a finalização e lançamento da película. Além disso, Martin Sheen, o protagonista, teve um ataque cardíaco. Marlon Brando enfrentava problemas de obesidade e Robert Duvall lutava contra o vício em cocaína.
“Por sorte, além de ser uma obra espetacular, ‘Apocalypse Now’ se saiu bem nas bilheterias e conseguiu dar a Coppola sua segunda Palma de Ouro no Festival de Cannes — ele havia conquistado a primeira cinco anos antes, em 1974, com ‘A Conversação’, que, até hoje, de todos os filmes que fez, ele considera seu preferido’, finaliza o curador.
Confira a programação aqui