Mauricio Stycer é jornalista com passagem por veículos como “Jornal do Brasil”, “Estadão”, “Folha”, “Lance!” e ”Glamurama”.
Atualmente é colunista e crítico do UOL, onde fala sobre TV.
Nessa entrevista exclusiva, o carioca fala sobre sua carreira, internet e seu novo projeto: um livro recém lançado sobre o apresentador Silvio Santos.
Confira:
Primeiramente, gostaria de saber como começou sua carreira no jornalismo.
Você sempre quis trabalhar com isso?
Estava no último ano da faculdade de jornalismo, na PUC, no Rio, no segundo semestre de 1985, quando tomei conhecimento da história de Antônio Fraga. Autor de uma pequena obra-prima, a novela “Desabrigo”, publicada em 1945, o escritor vivia esquecido e em situação econômica muito difícil na Baixada
Fluminense.
Ao ouvir a história, imediatamente procurei o “Jornal do Brasil”. Um pouco antes, a convite de Joaquim Ferreira dos Santos, eu havia começado a escrever como colaborador do Caderno B. Zuenir Ventura, então editor do Caderno B, nunca tinha ouvido falar de Fraga, mas achou a história incrível e me incentivou
a ir a Queimados, a 50 quilômetros do Rio, entrevistá-lo. O resultado do meu trabalho, “A solidão de um grande escritor”, foi publicado na capa do Caderno B, com chamada na primeira página do jornal, no dia 12 de novembro de 1985. No dia seguinte, na coluna Informe JB, Ancelmo Góis relatou que, ao ler a reportagem, o então presidente da República, José Sarney, mandou Marcos Villaça, presidente da LBA (Legião Brasileira de Assistência), ajudar Fraga.
Aos 69 anos, Fraga conseguiu seu primeiro emprego com carteira assinada – assessor especial D, matrícula 695.501, informa Maria Célia Barbosa Reis da Silva na biografia “Antônio Fraga, personagem de si mesmo”. Dois dias depois, Zuenir me pegou pelo braço e fomos a Queimados para um segundo encontro
com Fraga. A entrevista, “A voz de um escritor maldito”, foi publicada na última página da edição de domingo do Caderno B, dia 17 de novembro de 1985.
A leitura do livro de Maria Célia mostra que, por alguns meses, Fraga usufruiu da boa repercussão da matéria. Logo, porém, voltou a cair no esquecimento. Não me esqueço que Joaquim, na primeira vez que voltei à redação do “Jornal do Brasil” depois da publicação da reportagem, me disse: “Agora, você tem que
fazer outra igual”. Era, claro, uma provocação, um estímulo, e me marcou muito. Pode parecer bobo, mas para mim, então estudante, causou uma alegria sem tamanho ver que, às vezes, uma reportagem de jornal pode ajudar alguém.
_
Você é crítico de TV. Pode contar um pouco como funciona sua rotina de produção de textos? Como é assistir tantas coisas, estar por dentro de tudo, escrever críticas quase que diárias sobre tudo que está no ar?
Comecei a escrever mais sobre televisão no mesmo ano em que entrei no Twitter, em 2008. E é incrível ver, olhando para trás, como uma coisa se relaciona com a outra. Esta rede social é nova sala de estar, onde as pessoas se reúnem para assistir TV.
Digo isso para explicar que a minha rotina como crítico é muito ajudada pela interação com seguidores no Twitter. Eles me dão dicas, fazem alertas e apontam problemas o tempo todo em matéria de televisão. A tecnologia atual também facilita bastante. Hoje, é possível gravar para ver depois qualquer
programa, a maioria das emissoras coloca suas atrações na internet e há muita informação disponível. Ou seja, não é preciso mais ficar diante da TV 24 horas por dia para acompanhar o que está passando.
_
Conte uma curiosidade sobre o seu trabalho que ninguém imagina.
Muita gente, surpresa com a variedade de assuntos que comento, frequentemente me questiona: quantas TVs você assiste ao mesmo tempo. Acho graça desta pergunta. Tenho apenas um aparelho de TV!
_
É nítido que as pessoas estão lendo cada vez menos e passando muito tempo no Instagram e no Youtube. O que você pensa sobre isso? O jornalismo está mesmo morrendo?
Não acho que o jornalismo está morrendo. A revolução digital impôs mudanças profundas e drásticas à forma como se faz jornalismo. As mídias impressas foram as mais atingidas e estão tendo que se adaptar. Mas a importância do jornalismo, a necessidade que a sociedade tem de ser informada, não mudou.
_
Vamos falar um pouco sobre o livro do Silvio. De onde surgiu a ideia para o projeto? O que fez você optar por explorar a faceta de empresário dele?
Silvio é objeto de curiosidade pública desde o início dos anos 1960. A primeira biografia, uma HQ, é de 1969. A biografia mais influente, publicada no ano 2000, foi escrita por seu assessor de imprensa. Outras, embora bem pesquisadas, adotam o ponto de vista da celebração do “mito”. Por tudo isso enxergo que,
apesar da abundância, havia um vazio a ser preenchido. Mostrar que Silvio Santos é uma figura complexa, de carne e osso, e não um herói mitológico. É o que tentei fazer em Topa Tudo por Dinheiro, não sei se consegui, levantando histórias que mereciam ser contadas de forma mais objetiva e questões que
deveriam ser discutidas sob um ponto de vista crítico. É uma história com muitos episódios impressionantes, e nenhum tédio.
_
Silvio Santos vira sempre ”meme” nas redes sociais por conta de alguns comentários, digamos, curiosos. Em sua pesquisa para escrever o livro, qual foi o fato sobre ele que você achou mais interessante?
Vou citar dois. Silvio escondeu o seu primeiro casamento por acreditar que perderia o encanto diante das fãs se elas soubessem que ele era casado. Maria Aparecia Abravanel, conhecida como Cidinha, morreu em 1977 sem que ele reconhecesse publicamente que era casado. Isso deu margem a muita
especulação na época e o levou, em fevereiro de 1988, a dizer que escondê-la foi
“uma das coisas imperdoáveis que fiz”. Outro fato muito pouco conhecido foi a ajuda que Silvio deu à Globo, em São Paulo, na segunda metade dos anos 1960. A emissora, recém-comprada (chamava-se TV Paulista), enfrentava dificuldades financeiras e Silvio, que alugava horários aos domingos, emprestou dinheiro para ajudar a direção a pagar as contas.
_
Para fechar, você acha que a TV está ficando defasada? Você acompanha desde muito tempo o movimento de atrair grandes talentos para as maiores emissoras, depois aconteceu o ”boom” dos youtubers, alguns foram para a TV, outros se recusam a abandonar seus canais…
Acho que a TV está vivendo um intenso processo de transformação. É difícil fazer uma avaliação precisa estando no meio do furacão. Só vamos conseguir entender isso melhor à distância, daqui a muitos anos. Mas observo inúmeros movimentos ocorrendo ao mesmo tempo. O flerte com youtubers foi um deles.
Houve a ilusão de que gente jovem, que tem grande público no Youtube, seria o suficiente para renovar o perfil dos espectadores que assistem TV aberta. Foi uma ilusão que durou algum tempo.