15 filmes sobre abuso e violência contra a mulher

Especial mês das mulheres 

Nesse ano, março será lembrado de forma diferente aqui na coluna. Para relembrar o verdadeiro motivo do mês das mulheres, trago uma lista com 15 filmes inesquecíveis que falam sobre abuso, opressão e violência contra a mulher. Para manter sempre vivo na memória que é preciso resistir, lutar pelos nossos direitos e discutir as discriminações e violências físicas, sexuais e morais, que como nos lembra o cinema, ainda estão bem presentes na nossa vida e no nosso cotidiano.

Sei que existem muitos outros filmes além desses que escolhi para compor a lista abaixo, e ressalto a importância de todos eles. No entanto, fiz questão de trazer filmes de diversas origens, de ficção a documentário, brasileiro, hollywoodiano, europeu, indiano, africano, muçulmano, lembrando que não importa a etnia, a origem ou o credo, as mulheres sofrem constantemente abusos de todas as formas, por todo o mundo. Feliz dia.

A Cor Púrpura (The Color Purple) – 1985

“Olha só pra você. É negra, é pobre, é feia, é mulher. Você não é nada!’’ O filme mais antigo da lista é do diretor Steven Spielberg, foi indicado ao Oscar em 11 categorias, mas não levou nenhum. Foi baseado no livro de Alice Walker, apesar de muitas críticas quanto a fidelidade ao mesmo. É uma história que fica na memória pela crueza e densidade, que gira em torno de Celie, interpretada pela sempre comovente Whoopi Goldberg. Ela passa por inúmeras provações, abusos e violências na vida, sendo pobre, negra, analfabeta, na Georgia do século XX. Ela é invisível na sociedade. Até conhecer outras mulheres na mesma situação que a sua, lutam por liberdade e melhores condições de vida na sociedade. É um filme marco para a época e sensível as questões da luta das mulheres negras.

Tomates Verdes Fritos (Fried Green Tomatoes) – 1991

Esse clássico dos anos 90 dirigido por Jon Avnet aborda assuntos delicados com bastante sutileza. Baseado no livro de Fannie Flagg, a complexa história mescla passado e presente. E toca em assuntos tabu para a época sem maquiagens, como a luta racial dos anos 30, a violência doméstica, o desprezo nos relacionamentos, a imposição de padrões de beleza, e a relação íntima entre duas mulheres. Idgie (Mary Stuart Masterson) e Ruth (Mary-Louise Parker), Evelyn (Kathy Bates) e Ninny (Jessica Tandy) demonstram que a amizade e o amor podem ser uma via otimista para a evolução do mundo. Esse filme foi importante ao abordar as questões sobre o papel da mulher na sociedade.

Dormindo com o inimigo (Sleeping with the Enemy) – 1991

Do diretor Joseph Ruben, o famoso filme dos anos 90 com a tão aclamada Julia Roberts no papel da esposa vítima de constantes abusos e atos violentos do marido opressor (Patrick Bergin). Muitos dizem que o filme não passa de um clichê, cheio de furos e que se não fosse estrelado por Julia, não teria sido o grande sucesso de público que foi. Eu dou o merecido valor a esse filme justamente pelo mesmo motivo. Foi importante colocar uma atriz tão conhecida mundialmente para tratar de um assunto sério, chamando atenção para o que ninguém queria ver. E se essa história é um clichê, só prova que muitas liberdades ainda precisam ser conquistadas. Algumas cenas são de revirar o estômago, provocam raiva e medo pela personagem Laura/ Sara, fazendo com que o filme seja um dos mais lembrados ao falar em abuso e violência doméstica no cinema. Portanto, deixemos os furos e finais felizes a parte, porque é disso que Hollywood vive (e gosta).

Fale com Ela (Hable con Ella) – 2002

Esse filme do Almodóvar trata sobre abuso sexual e estupro de uma forma absurda e ao mesmo tempo tenta romantizá-la. De toda forma, esse não é o cerne da história, que gira em torno de duas relações homem e mulher, a toureira Lygia (Rosario Flores) e o jornalista Marco (Darío Grandinetti), o enfermeiro Benigno (Javier Cámara) e a bailarina em coma, Alicia (Leonor Watling). Muitos críticos julgam o que Benigno sente pela bailarina, algo como devoção. Não é, na verdade é perversão. O filme choca nesse ponto e parece que foi feito com esse intuito, profundo, intenso, repugnante. Nitidamente Almodóvar recorre a temática do abuso que as mulheres sofrem, mas nunca com tanta delicadeza, quase se desculpando, deixando claro que isso não pode ser coerente.

Pelos meus olhos (Te doy mis ojos) – 2003

O filme espanhol, vencedor do Goya, da diretora Icíar Bollaín conta a história de Pilar (Laia Marull), que numa noite resolve fugir do seu marido violento levando junto o seu filho. O filme retrata o modelo do processo de fuga: o marido que se diz arrependido, a esposa que acredita e volta, para novamente perceber que as atitudes violentas não terão fim. É um filme duro e importante, é real demais e por isso mesmo, é difícil de assistir, a previsibilidade da história assusta mais do que gostaríamos de admitir.

Moolaadé (Uma Mulher Contra um Ritual Machista) – 2004

Do diretor senegalês, Ousmane Sembene (primeiro diretor africano a ter prestígio internacional), o filme fala sobre o ritual de mutilação do clitóris praticado em crianças de uma aldeia africana com o discurso da purificação. A protagonista Collé Ardo (Fatoumata Coulibaly), é contra esse ato violento e sem fundamento real, e impede que seja realizado em sua filha, enfrentando as outras anciãs que realizam o procedimento, e protegendo as meninas que fugiram do ritual. Dessa forma, ela clama pela proteção sagrada Moolaadé, e enfrenta a sua aldeia e a violência de seu próprio marido. O filme promove o contato com a cultura de um povo, onde os costumes machistas e a violência contra a mulher ditam as regras, e funciona como um alerta para as mulheres que são mutiladas em nome de costumes em tantas regiões do mundo.

Anjos do Sol – 2006

O filme brasileiro dirigido por Rudi Lagemann é um soco no estômago. Com cenas fortes de agressão, é sempre o primeiro que me vem a cabeça quando penso em violência e abuso. Maria (Fernanda Carvalho) tem 12 anos, mora no interior do nordeste do Brasil, vinda de uma família muito pobre, seus pais decidem vendê-la para trabalhar como prostituta em um garimpo na Amazônia. O filme procura chamar atenção para a exploração sexual infantil ainda muito presente em todo o país, faz isso de forma seca, tudo as claras, sem panos quentes. Muitas cenas são tristes e chocantes, a violência presente no tratamento dos homens com as meninas, o analfabetismo, os abusos sexuais, a pedofilia, o tráfico de meninas, tudo isso compõe a temática do filme em uma narrativa bastante real. 

Os Homens que Não Amavam as Mulheres (Män som hatar kvinnor) – 2009

O filme sueco do diretor dinamarquês Niels Arden Oplev é baseado no livro de ficção do jornalista Stieg Larsson. Na história, o jornalista Mikael Blomkvist (Michael Nyqvist) é chamado para investigar o desaparecimento de uma mulher que já dura mais de 40 anos. A parte toda a trama policial que envolve o espectador, tudo em torno da história gira ao redor do ódio que alguns homens sentem pelas mulheres, ilustrados por uma série de atos violentos, assassinatos, estupros e abusos de toda forma. Lisbeth Salander (Noomi Rapace) é a protagonista, uma hacker órfã, que sofreu diversos abusos sexuais e psicológicos por toda a vida. Ela aparece para ajudar Mikael nas investigações, no entanto, rouba a cena, com seus atos de vingança, que representam acima de tudo, a vitória da vítima. Lisbeth é a representação da anti-submissão, e a tentativa de ser livre sem a constante presença do medo.

O Anticristo (Antichrist) – 2009

O drama polêmico dinamarquês dirigido por Lars Von Trier é uma carta aberta e declarada sobre misoginia. O filme gera desconforto, claramente. Charlotte Gainsbourg e Willem Dafoe vivem um casal deprimido pela perda recente de um filho, se mudam para uma cabana no meio do mato. Diante de uma série de metáforas complexas e alucinações, que caberia interpretá-las em um livro, aqui é importante salientar para a questão da violência com o sexo feminino, levantando questões relevantes, como o feminicídio, e como a protagonista acaba sendo considerada louca no final e culpada pelos problemas do filho morto. Logo, problematiza alertando para o fato da culpa das vítimas caírem sob elas mesmas, pelo simples motivo de serem loucas.

Cairo 678 – 2010

“As mulheres são loucas” Dirigido por Mohamed Diab, o filme trata do assédio ás mulheres na sociedade egípcia extremamente machista, onde a justificativa desses atos é sempre de que a culpa é da mulher. Tais práticas, denuncia o filme, são comuns e na maioria das vezes, toleradas pelas autoridades, escondidas atrás do discurso religioso. A história tem o foco em três protagonistas: Fayza (Bushra), Seba (Nelly Karim) e Nelly (Nahed El Sebaï), todas sofrem assédio diariamente e devem permanecer caladas. O filme é o retrato de uma sociedade que objetifica a mulher e a diminui, no entanto fornece esperança de mudança. Suas protagonistas são fortes e optam por lutar contra isso, sem se vitimizar.

Depois de Lucia (Depués de Lucía) – 2013

Nesse drama seco do mexicano Michel Franco a maldade humana é retratada, mais especificamente a violência que as mulheres podem sofrer, tanto sexual quanto psicológica, tudo isso de forma natural e brutal. O filme retrata o luto de Alejandra (Tessa La) e seu pai, depois que sua mãe morre. Ambos se mudam para a Cidade do México, na tentativa de recomeçar, mas encontram problemas em se adaptar a nova vida. Seria muito inocente achar que se trata apenas de um filme sobre bullying na escola, é um filme sobre culpa e também sobre até que ponto os julgamentos podem levar a abusos e agressões ás mulheres, sem rodeios, tenso e realista, verdadeiramente angustiante.

A Filha da Índia (India’s Daughter) – 2014



“Nós temos a melhor cultura, na nossa cultura não há espaço para a mulher.” O documentário da diretora Leslee Udwin fala sobre o estupro coletivo que culminou na morte da jovem  Jyoti Singh, que ocorreu em Nova Déli em 2012, quando estava em um ônibus voltando para casa. O crime revoltou as mulheres da Índia, que fizeram protestos por todo o país. O filme mescla entrevistas com parentes e pessoas próximas da vítima, com estupradores, homens da Índia, e cenas dos protestos que ocorreram, na intenção de mostrar como uma cultura pode ser baseada na diminuição do papel da mulher, como seres inferiores e passíveis de atos violentos de todas as partes.

Paraíso (Ma dar behesht)- 2015

Filme do diretor iraniano Sina Ataeian Dena, que tem objetivo de mostrar as mulheres iranianas não apenas como vítimas, mas como seres humanos. A história acompanha a vida de Hanieh (Dorna Dibaj), professora primária que viaja diariamente por duas horas para lecionar numa escola só para meninas. A história é uma crítica a sociedade iraniana que cria meninas castradas pelos costumes religiosos, e ao mesmo tempo é um ode a evolução e ao alcance as liberdades.

Hunting Ground – 2015

O filme funciona como uma lembrança que as agressões e o assédio sexual são constantes e estão sempre muito próximos em qualquer parte do mundo. O documentário do diretor americano Kirby Dick, mostra os depoimentos de diversas mulheres vítimas desses atos em campus de universidades americanas, e a impunidade por parte dos agressores. O filme retrata os resultados físicos e psicológicos que o assédio e a violência podem causar.

O quarto de Jack (Room)- 2015

O filme mais recente da lista, que rendeu o Oscar 2016 de melhor atriz para a protagonista, Brie Larson, muito bem merecido por sua atuação impecável junto com o pequeno e talentosíssimo Jacob Tremblay, é dirigido pelo irlandês Lenny Abrahamson. Brie é a mãe de Jack (Jacob Tremblay) na trama. A princípio a história gira em torno de Jack e a forma como sua mãe lhe ensina sobre as coisas do pequeno mundo do quarto onde vivem, tudo o que o menino conhece até então. Na realidade se trata de uma história pesada sobre abuso e sequestro, no entanto o diretor conseguiu trazer elementos que dão leveza ao filme, por mais incrível que pareça, e que o tornam paradoxal em si mesmo. O menino é a lembrança e o fruto de abusos e violência, mas se torna ao mesmo tempo a fonte da liberdade, esperança e amor, dentro e fora do cativeiro. Pensar que foi baseado em tantos fatos reais, é de uma tristeza sem igual.

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