Mesmo o mais distraído espectador de filmes alternativos não vai deixar de perceber logo nos primeiros cinco minutos de filme, que Mistress America segue exatamente a mesma linha de Frances Ha. Poderia ser apenas coincidência, mas não é. O diretor Noah Baumbach deixa claro a sua assinatura em ambos os filmes, fazendo este parecer uma continuação do anterior, com pitadas bem generosas de sarcasmo, e abordando mais uma vez a questão das dificuldade de se ter sucesso na carreira em meio ao caos das grandes cidades nos dias atuais.
Nova Iorque é palco da narrativa de novo, a cidade fria e impessoal que não acolhe mas instiga e vicia. Greta Gerwig dessa vez aparece como Brooke, novamente dona de um humor despretensioso, que utiliza de elementos reais, e consegue rir das circunstâncias do dia a dia por mais tensas que pareçam. É impossível não fazer a comparação com Frances Ha, a cada cena, por mais maravilhoso e incomparável que tenha sido o primeiro filme.
Talvez a grande dificuldade de Mistress America esteja justamente nesse fato, tendemos a pensar o tempo todo que Brooke é Frances, um pouco mais velha e um pouco mais pé no chão. Mas como nada poderia se comparar com a juventude, os diálogos e a fotografia sensacionais de Frances Ha, o filme em questão parece perder alguma coisa. Assim, ficamos querendo mais, buscando mais, sem os maravilhosos insights do filme anterior.
Ainda assim, Mistress America tem o seu valor e a sua glória. A atrapalhada e carismática Greta Gerwig, ilumina o filme e mantém o posto de musa do cinema independente americano. Dessa vez, a trama gira em torno da vida de Tracy (Lola Kirke), que acaba de se mudar para Nova Iorque para cursar faculdade de literatura, vinda de uma cidade do interior, deslumbrada, tímida e inexperiente. Sem conseguir fazer amigos e se sentindo sozinha, ela vai atrás de Brooke, filha do noivo de sua mãe, na tentativa de conseguir se ambientar na cidade.
A partir daí, a relação das duas cresce a ponto de parecerem irmãs de sangue. Brooke é a menina popular e descolada que Tracy sempre quis ser: fala muito, chama atenção, dança, canta, é agitada como Nova Iorque, e desliza confortavelmente pela megalópole. Através de diálogos desenfreados, onde Tracy mais escuta do que fala, ela conta toda a sua vida, é um livro aberto. Com a intimidade e aos poucos, a introvertida Tracy vai se transformando, e uma nova faceta de Brooke vai aparecendo. Nem todos são perfeitos, e o diretor parece gostar de deixar transparecer sempre um lado podre que habita seus personagens junto com seu melhor lado, são todos muito humanos, cheios de defeitos e qualidades na mesma medida.
Não passa despercebida a crítica a sociedade materialista, suas personagens são românticas incuráveis e almejam a felicidade ou a glória acima dos bens materiais. Ambas estão no controle de suas vidas, são independentes, inteligentes e obstinadas, cada uma a sua maneira.
O interessante do filme é perceber que seus personagens vivem como na vida real, onde muitas coisas parecem dar errado e nem sempre somos escolhidos para viver os melhores papéis. Tudo sempre parece dar certo para os outros, menos para nós. O diretor retrata essas imperfeições da vida, mas com um ar otimista, os finais não são os ideais e os sonhos nem sempre se realizam, mas quer saber? Tudo bem se for assim. Noah Baumbach parece querer deixar como mensagem que a felicidade pode estar no caminho, no processo, na tentativa.