Um jogo de feixes de luz na escuridão entrando por pequenos buracos, a poeira se movendo no ar, pontos focais. Através dessa linda simbologia começa o novo filme do diretor norueguês Erik Poppe , que conta a história de Rebecca, uma renomada fotógrafa de guerra, que está dividida entre a família e o amor à profissão. Interpretada pela talentosíssima e sempre brilhante, Juliette Binoche, Rebecca carrega o drama de possuir um trabalho onde arrisca sua própria vida diariamente, e faz isso com prazer, diria até mais, isso alimenta a sua alma.
A grande questão é conciliar os dois amores, Rebecca é muito mais do que uma mulher de vida provinciana, ela é a força e a coragem. O marido não aceita, as filhas sofrem. O diretor trabalha a história centrada nesse drama familiar, que decisão tomar entre o trabalho e a família? Nikolaj Coster (Game of Thrones) faz Marcus, o marido de Rebecca, que possui um papel maior do que de um simples pai para as filhas do casal, ele é o grande provedor, o porto seguro e aquele que cuida para que tudo em casa entre nos eixos da rotina. Rebecca e Marcus são como o mar e a terra, por mais que se encontrem não se constituem da mesma matéria.
Apesar dos enquadramentos fechados e pouco aproveitados na tela do cinema, a fotografia do filme merece aplausos. Há encanto nas imagens, nas cores do oriente, o azul contrastando com o clima árido nas cenas de guerra, o foco nos olhares, tristes, inconformados. As cores em meio ao caos. Por outro lado, o filme mostra uma Irlanda fria, cinza, tempestuosa. Dessa forma, remete muito ao neo realismo dos filmes iranianos, ora pesadamente poético, ora friamente político.
Não tem como não se deixar tocar pela forte relação de Rebecca com sua filha mais velha, a doce Steph (Lauryn Canny). A cena mais tocante na minha opinião é quando as duas conversam no carro, a mãe se desculpa pela ausência, pela escolha, é palpável o peso da saudade, do amor, do medo de perder. A filha pega a câmera e aponta para a mãe, que chora, milhares de cliques consecutivos no silêncio do desespero, não poderia haver cena que captasse mais a poesia da história e sintetizasse toda ela de uma vez: uma câmera, uma lágrima, milhares de arrependimentos, mil vezes boa noite nunca ditos. Como um soco no estômago, forte. Indigesto, tomando emprestada as palavras de uma grande amiga, a quem dedico esta crítica.
É forte o impacto da crítica política e social que o filme aborda, e vai até a última cena forçando o espectador a se inquietar e se chocar: mulheres bomba no Afeganistão, burcas correndo ensanguentadas, guerra civil na África, matança, fotos impiedosas, corpos estendidos no chão, gritos desesperados. O contrapeso é a volta pra casa, onde a história se acalma, fica linear, dando tempo para o espectador respirar. Rebecca luta na verdade por uma causa, seu ímpeto em continuar a trabalhar está em fazer algo por aqueles que foram esquecidos por todos, mesmo que seja contando pro mundo através das imagens. Que na sabedoria popular, valem mais do que mil palavras.