tos SERGIO SANTOIAN

8 perguntas para… Antonio Saboia

Nascido em Paris, filho de mãe francesa e pai maranhense, Antonio Saboia é conhecido por seu trabalho nas séries ”O Negócio”, da HBO, e ”O Mecanismo”, da Netflix. Também atuou nos longas ”Lula, o Filho do Brasil”, ”O Lobo Atrás da Porta” e ”Confia em Mim”.

Esse ano, é uma das estrelas do forte ”Bacurau”, novo filme de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, sucesso de público e crítica desde sua estreia.
Nessa entrevista exclusiva, o ator fala sobre o começo da carreira, inspirações e o novo projeto: a série ”Santos Dumont – Mais Leve que o Ar”.

Confira:

 

Gostaria de saber como começou o seu interesse pela atuação.
Aos 14 anos, entrei no curso de teatro da minha escola sem saber ao certo no que daria. Um dia o professor pediu que preparasse uma cena de um clássico francês. Seria o papel de um advogado de uma pequena cidade às voltas com as infidelidades da esposa. Não fazia a menor ideia de como abordar esse trabalho, mas na época passava a segunda parte do ”Poderoso Chefão ”na TV e uma cena entre Al Pacino e Diane Keaton acabou inspirando a construção do meu personagem e o tom da cena… O processo todo de preparação foi tão prazeroso que despertou algo em mim e me fez querer seguir a carreira. O problema é que depois disso sempre arrumava um jeito de trazer um gangster para o palco, não importava que fosse Molière ou Shakespeare… (risos).

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E como o filme ”Bacurau” chegou até você? Foi através de testes?
”Bacurau” chegou via Facebook. Marcelo Caetano (”Corpo Elétrico”) me mandou uma cena, gravei um selftape gigante (a cena tinha 5 minutos) e mandei de volta. Cruzei os dedos, esperei e tive sorte.

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O que você está achando de todas as discussões que o filme está levantando?
É maravilhoso ver o filme instigar e provocar tanto debate. Muito do que acontece em Bacurau acontece no Brasil. O desprezo pela cultura, pela educação, o racismo estrutural e tantas outras questões que o filme levanta. Muitas pessoas parecem se identificar com os heróis do nosso filme.

 

Como foi trabalhar com Kleber [Mendonça Filho], Juliano [Dornelles] e Karine [Teles]? O que você pode destacar das filmagens do sertão e da vivência com eles?
Foi um privilégio enorme trabalhar com toda a galera de ”Bacurau”. Kleber e Juliano são dois diretores apaixonados por cinema, por histórias, por pessoas e de uma extrema inteligência e generosidade dentro como fora do set. Eu já tinha trabalhado em um filme com Karine sem a gente ter se cruzado antes (”O Lobo Atrás da Porta”, de Fernando Coimbra). E no set de ”Bacurau” ela virou uma grande amiga, um desses encontros muito especiais que esse filme me proporcionou. Fizemos a série “GILDA” juntos logo em seguida. Tenho muito admiração pelo trabalho dela.

 

O roteiro do filme é muito forte. Como foi a construção de seu personagem, um forasteiro que chega e tem papel importante na transformação que a pequena cidade vive?
Fui até Parelhas, no Rio Grande do Norte, com a Karine para ensaiar. Ficamos dois dias lendo, experimentando, debatendo, trocando ideias. Até então, não tinha noção do que se tratava. Eu descobri o roteiro quando cheguei lá. A construção do personagem foi inspirada de uma parcela ponderável da população brasileira que não valoriza sua própria cultura, seu povo e que é totalmente submissa ao que vem de fora. Meu personagem é uma espécie de símbolo desse complexo e desse desprezo “made in Brazil”, um completo escravo dessa ideia de que tudo que vem de fora há de ser melhor.

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Esse ano teremos ainda ”Hebe” e ”A vida invisível” nos cinemas, dois filmes com protagonistas fora do comum. Em sua opinião, o cinema nacional está num momento de amadurecimento e de protagonismo feminino? Como avalia esse momento?
Finalmente e graças a Deus! Mas ainda tem muito trabalho pela frente. Certos padrões coloniais de beleza física e ”eterna juventude” são ainda pré-requisitos quase obrigatórios no mercado audiovisual. Predomina ainda essa ideia de que o público não quer ver pessoas normais protagonizando filmes mas sim uma projeção idealizada e/ou sexualizada, erotizada do ser humano, e principalmente, da mulher. Projetos como esses precisam mesmo se multiplicar nas telas porque são obras que procuram justamente questionar essa objetivação da mulher e abordar questões mais profundas ligadas à condição feminina.

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Esse ano você ainda vai estar em ”Gilda” e ”Santos Dumont”. O que pode nos adiantar sobre esses projetos?
São dois projetos muito especiais pra mim! “Gilda” fala de empoderamento feminino no contexto de uma sociedade conservadora, preconceituosa. E diante desse quadro, Gustavo Pizzi, o diretor, inverte totalmente os códigos machistas do cinema. ”Santos Dumont” retrata um dos personagens brasileiros mais importantes da história contemporânea. Faço o papel de Louis Blériot, o concorrente francês do Dumont, o cara que por um triz não voou antes mas foi o primeiro piloto a arriscar a travessia aérea do Canal da Mancha.

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Para fechar: quem inspira? 
Martin Scorsese e seus primeiros filmes, como ”Touro Indomável”.